Manel Aincha assim apelidado, foi um pescador de Esposende o
qual tive oportunidade de trabalhar no mar. Era um homem forte, musculoso,
parecia o Popeye. Não andava no ginásio nem praticava nenhum desporto era assim
por natureza e força do trabalho.
Lembro-me bem de quando as redes pegavam no fundo o ALADOR,
(aparelho auxiliar de recolha de redes), andava para trás e ele como segurava os cabos,
(cordas) ao alar, (recolher redes) as malhas pegavam-me nos dedos e rebentavam,
não os dedos dele mas as próprias malhas de sediela, se fosse num dos comum mortais
os dedos eram cortados de certeza.
As suas mãos pequenas e tão calejadas pela vida rude no mar
suportavam tão dilacerantes golpes.
Apesar da sua estatura baixa, mas bastante robusta era um
homem muito sensível, não sendo muito difícil se emocionar.
Passo a contar então uma passagem verídica com este camarada
de mar.
Como habitualmente e quando o mar permitia íamos pescar mas em
Viana do Castelo, devido às melhores condições que essa barra oferece.
O mestre Francisco começava a fazer a recolha dos nossos
tripulantes por as casas de cada um.
Arrancávamos por volta das 3 horas da madrugada em direcção à praia do cabedelo em Viana do Castelo.
Na praia tínhamos o bote, (embarcação pequena) que nos
transportava a remos para a motora, (embarcação de madeira de grande calibre)
com mais ou menos 16m de cumprimento.
Rumava-nos para o alto mar, (algumas milhas fora da costa)
12 a 14 milhas, milha marítima, (1852m).
Durante a viajem de mais ou menos 2 hora podíamos ir para o beliche
descansar um bocado até chegar à bóia para começar a alar a caça, (extensão de
redes unidas em linha longitudinal).
Quando o tempo estava bom era uma maravilha, só se via água,
céu e de vez em quando os nossos amigos golfinhos.
Um dia depois de feita a recolha das redes e retirado o
peixe, tamboris, rodovalhos e raias era a hora de as voltar a largar no mar,
como não era a minha vez de largar dirigi-me para a proa a parte mais alta da
embarcação.
Os golfinhos não nos largavam, saltavam, guinchavam, estavam
contentes por nos ver também, de repente um golfinho bebé ficou preso nas redes
que estávamos a largar, os meus camaradas não deram por ela porque o barco ia
em andamento e tinham que se concentrar para não ficarem peados, (presos) nas
redes e ir borda fora, eu como estava livre via o golfinho a batalhar por a
vida.
Furou as redes e ficou preso pela cauda, nadava com toda a
força até á superfície para poder respirar e suportada o peso cada vez maior das
redes que tinham chumbos.
Dei o alerta e o mestre Francisco ordenou que se recolhessem
de novo as redes para dentro e com isso salvar o golfinho.
Enquanto isso os golfinhos guinchavam de aflição, preocupados
com o seu bebé.
Tocou ao Manel Aincha, safar-lhe as malhas da cauda e
devolve-lo ao mar, enquanto o fazia de lágrimas nos olhos despedia-se do
golfinho dizendo.
- Vai embora amor vai para a beira a tua família, o golfinho
depois de ser devolvido ao mar mesmo com a cauda muito cortada podia ter ido embora,
mas não, agradeceu em poucos segundos ao pescador que chorava a falar para ele,
emitia uns guinchos como que a dizer, obrigado.
De repente todos os golfinhos fizeram um grande rodopio e
desapareceram todos.
Tive o privilégio de trabalhar com homens como este, duros
como aço, mas coração de manteiga.
Apesar de o meu pai ter sido pescador ele nunca quis que eu
fosse, talvez com medo de me perder, por ser o filho mais novo do primeiro casamento,
mas eu digo de coração cheio que apesar do risco era a melhor profissão do
mundo, o contacto com a natureza a aventura a independência.
Quando regressávamos a casa as pessoas olhavam-nos, murmuravam,
sabiam que éramos aqueles que enfrentavam a vida e a morte por a frente.
Esta passagem aconteceu pela minha breve passagem como
pescador, eu tinha na altura 17 anos.
Admiro os pescadores porque são homens diferentes, nem todos
nascem com a capacidade, coragem, audácia, sangue frio, deles.
Luís Eiras.
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